sábado, 17 de setembro de 2011

Sobre o Perdão

O tema do perdão parece por demais religioso e muitas vezes perdoar pode parecer o mesmo que ser conivente com uma injustiça. Falar de não-violência, no entanto, implica em falarmos de perdão e implica muitas vezes voltarmos às doutrinas de Jesus, que foi um mestre da não-violência. Ainda que saibamos que ao longo da história os cristãos não tenham dado muita atenção para esse importante tema, é precípuo que fique manifesto que o ensinamento de Jesus é um ensinamento da não-violência e que há uma distância enorme entre a mensagem de Jesus e a necessidade de uso da força para a manutenção da ordem social ou para o estabelecimento da justiça.

No que o perdão pode ser a principal arma não violenta e em que sentido ele instaura uma nova norma de justiça?

Jesus falou: “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem”. Essa frase de LC 23, 34 identifica a fonte da não violência. Quem pode ser capaz de perdoar a injustiça máxima cometida contra si, esse é um indivíduo não violento. Os cristãos, no entanto, que por séculos perseguiram os judeus, chamando-os de deicidas, em nenhum momento o fizeram por amor a Jesus, mas provavelmente por ódio aos outros e em nome da guerra.

Quando Jesus pronuncia essas palavras? Ele o faz num momento de abandono absoluto, em que é alvo do ódio e se mostra como vítima completamente nua a indefesa. A não-violência mostra aqui seu lado paradoxal: a força de um homem reside em ser indefeso e manso. A maior de todas as violências, a violência divina que instaura uma nova ordem no cosmos é aquela que é capaz de renunciar ao seu desejo de vingança, que é o mesmo que sustentar a ordem vigente, e instaurar uma nova ordem. O perdão é a renúncia plena ao mal que teríamos o direito de cometer para repararmos uma injustiça. “Pai perdoai” significa, Pai não os permita que sofram uma violência como esta. Mas significa também: Pai, transporta-os para outra ordem, a ordem do amor e da Graça que tornam toda violência inútil e impossível mesmo.

A oferta do perdão está em continuidade com seus atos e palavras. “Felizes os artesãos da paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5, 4-9). “Amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam, abençoai os que lhe amaldiçoam e orai pelos que vos caluniam. A quem der um tapa em uma face, oferece também a outra”. (Lc 6, 27-29). Jesus não se contenta apenas em falar da não violência: ele oferece sua morte como um exemplo de agir santo e puro, desprovido de qualquer ódio. Isso, no entanto, não significa que ele tenha sempre palavras doces aos outros. Ele chama os fariseus e escribas de hipócritas (Mt 23, 13). E ele foi capaz de uma atitude enérgica contra aqueles que faziam do Templo um lugar de comércio (Mt 21, 12-13). Jesus foi sempre severo e duro com seus adversários, quando estes exploravam o povo e lhes colocavam cargas demais no ombro dos pobres. No entanto, quando se trata de uma injustiça feita a si, ele perdoava.

O que é então, o perdão?

Importa, antes de tudo, eliminar certas imagens que nos vêem ao espírito quando falamos de perdão. Em primeiro lugar, perdoar não é esquecer. Sempre se associou o perdão ao fecharem-se os olhos às injustiças para se salvaguardar um falso conceito de paz. Nesse sentido, esquecer é uma covardia que se recusa a encarar a realidade. Em segundo lugar, o perdão não é apatia. Essa é uma fuga na indiferença, e é um grande mal. Em terceiro lugar, o perdão não é ingenuidade, não é desconhecer o mal. Finalmente, o perdão não é um laxismo, de deixar a si mesmo sempre em desvantagem. Isso porque isso abre uma porta para que injustiças se repitam, que os opressores continuem suas maldades. É preciso ver também que o perdão não é uma atitude de querer se mostrar superior ao que nos causa dano. Na verdade, o perdão quer mostrar liberdade e força de espírito. Jesus ao perdoar não está sendo nem ingênuo, posto que conhece na própria carne a miséria humana. Ele está alertando para a necessidade de uma mudança de atitude quando sofremos algum mal.

Eu continuo...
Rochelle

Um comentário:

  1. Profa Rochelle, tomei a liberdade de postar os dois textos sobre perdão em meu Blog - OLHAR FILOSÓFICO.
    Paz Profunda

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