segunda-feira, 26 de março de 2012

O Homem e o Não-lugar: Análise do filme “O Terminal”.
*Por Roberto Wagner Urquiza 
O homem se encontra diante do irracional. Sente em si o desejo de felicidade e de razão. O absurdo nasce desse confronto entre o apelo humano e o silêncio irracional do mundo. Albert Camus (O mito de Sísifo, p.41).


O mundo contemporâneo, comprimindo cada vez mais o tempo e o espaço, tende a mergulhar o sujeito numa situação de constantes movimentações. O homem está afastado de referenciais fixos e estáveis, tem dificuldade de saber quem ele é realmente, vive no que o filósofo Gilles Lipovetsky (2005, p.7) chama de “era do vazio”. Para o filósofo“a sociedade hipermoderna é aquela em que reina a indiferença da massa, na qual domina o sentimento de repetição e estagnação, na qual a autonomia particular avança por si mesma, a sociedade é ávida por uma identidade”. O homem perdeu sua fé nas promessas da ciência moderna e da religião, se tornou um hedonista radical, se tornou um super-homem, para Fromm (1987)
            O homem tornou-se um super-homem, mas super-homem com poderes sobre-humanos que não atingiu o nível de razão super-humana. Na medida em que aumentam seus poderes, ele se torna um homem cada vez mais pobre, impõe-se sacudir nossa consciência ao fato de que nos tornamos tanto mais desumanos quanto mais nos convertemos em super-homens.
 Assim, o homem vive um tempo em que se sente como no mito de sísifo, rolando inutilmente uma pedra montanha acima, e vê essa pedra rolar montanha abaixo, o mito virou sinônimo de trabalho inútil, conforme Albert Camus, muito bem relatou, mas Camus (2006) nos dá um conselho pertinente, que no final é “preciso imaginar Sísifo feliz”.
            O homem tem passado por um processo de desumanização que o tem levado a colocar o racional a serviço do irracional, “pois quanto mais os indivíduos se libertam das regras e dos costumes em busca de uma verdade pessoal, mais seus relacionamentos se tornam fratricidas e associais.” (LIPOVETESKY, 2005, p.45).
 O individualismo surge como um mal contra o qual o homem tem lutado, e surgem então os não-lugares, a idéia de Marc Augé para não-lugar é a de uma instalação que é utilizada para a circulação de pessoas e bens, no não-lugar, não há espaço para exercitarmos nossa humanidade. No filme “O terminal” um imigrante se vê obrigado a fazer do não-lugar um lugar, um ambiente que é impessoal, um local passageiro, passa a ser um lugar onde a interação humana confere sentido.
 O que se vê no filme é uma inversão, o não lugar passa a ser um lugar, o protagonista confere ao não lugar um pouco de sua humanidade, arranja trabalho, faz amizade com os funcionários, consegue uma namorada, o típico vazio que é o não-lugar agora é o lugar onde cada um se constrói sujeito de sua história. Essa transformação do não-lugar para lugar, foge totalmente do convencional; as pessoas vivem mais em não-lugares do que em casa, geralmente se almoça em self-service, assiste-se a televisão enquanto se espera sua vez no dentista, enfrenta-se a fila do ônibus na rodoviária.
            O protagonista oferece solidariedade e altruísmo, instigando a socialização, o que foge da realidade dos tempos hipermodernos, um tempo de excesso e vazio existencial.

 BIBLIOGRAFIA: 
AUGÉ, Marc. Não- lugares: introdução a uma antropologia da sobremodernidade. Trad. Lúcia Mucznik, Bertrand Editora, 1994.
CAMUS, Albert. O Mito de Sísifo. Tradução de Ari Roitman e paulina Watch. 3ªed. Rio de Janeiro, 2006. 
FROMM, Erich. Ter ou Ser? Tradução Nathanael caixeiro. 4ª ed. Rio de Janeiro. LTC, 1987. 
LIPOVETSKY, Gilles. A era do vazio. Ensaios sobre o individualismo contemporâneo. Tradução Therezinha Monteiro Deutsch. São Paulo. Manole, 2005.
*Licenciado em Química e Pedagogia,  Especialista em Filosofia e Química, Licenciando em Filosofia pela Universidade Católica de Brasília.

Um comentário:

  1. Achei esse texto deveras interessante... Ele me remeteu a letra de uma música da Pitty que gosto muito... É de fato necessário que o Homem não perca a capacidade de se reinventar... segue abaixo a letra que citei:


    Déjà Vu
    Pitty

    Nenhuma verdade me machuca
    Nenhum motivo me corrói
    Até se eu ficar só na vontade, já não dói
    Nenhuma doutrina me convence
    Nenhuma resposta me satisfaz
    Nem mesmo o tédio me surpreende mais

    Mas eu sinto que eu tô viva a cada banho de chuva que chega molhando meu corpo nu

    Nenhum sofrimento me comove
    Nenhum programa me distrai
    Eu ouvi promessas e isso não me atrai
    E não há razão que me governe
    Nenhuma lei prá me guiar
    Eu tô exatamente aonde eu queria estar

    Mas eu sinto que eu tô viva a cada banho de chuva que chega molhando meu corpo...

    A minha alma nem me lembro mais
    em que esquina se perdeu
    ou em que mundo se enfiou

    Mas já faz algum tempo
    Já faz algum tempo
    Já faz algum tempo
    Já faz algum tempo
    Faz algum tempo...

    A minha alma nem me lembro mais
    Em que esquina se perdeu
    ou em que mundo se enfiou

    Mas eu não tenho pressa
    Já não tenho pressa
    Eu não tenho pressa
    Não tenho pressa

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